sexta-feira, 19 de agosto de 2011



CÉU DE SANGUE
Respiro fuligem e solidão...
Sinto-me assim:
um na multidão,
flor no concreto,
pássaro sem direção,
sem norte,
sem verão.

Aspiro à glória decadente...
Sinto-me assim:
passado recente,
veterano inveterado,
sobrevivente do Vietnã,
sem pernas,
sem pátria,
sem nada.

Pária do mundo,
parte do todo,
multiplicado,
excesso,
regresso,
ordem e progresso
(bandeira desbotada).

Passos,
paisagens vãs que se vão
levam meu olhar.
Permaneço aqui,
incrédulo,
imóvel,
entre o desespero
e a candura.

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UM ÚLTIMO OLHAR
Perde as esperanças,
por favor.
O passado passou,
o futuro não vem.
O presente?...
Ah, esse não me diz nada!...

Corre por caminhos obscuros,
derrama lágrimas
(as suas últimas, por sinal)
e escreve uma carta
(suicida, amorosa, de saudade, não importa).

A vida passará como um pesadelo doce,
após o amargo da dúvida,
como se oca a vida fosse.
 
Certezas nunca teremos.
Morreremos um dia,
numa primavera melancólica
cuja brisa acaricia as folhagens tenras.

Sim, morreremos numa primavera
(que bela estação para morrer!),
sem glória,
sem flores,
sem dores,
sem história.

Apenas uma canção triste
será a trilha-sonora
em compassos fúnebres,
sem sintonia,
sem amanhã,
numa despedida
serena,
sincera,
suave quimera.

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